Leonardo se pronunciou contendo a risada que o jeito "alto" do amigo queria lhe despertar. Era evidente que o companheiro já havia ingerido mais doses de vinho do que o usualmente esperado para um período anterior à uma cerimônia de casamento. Algumas pessoas ao redor, porém, não se contiveram tanto e riam baixo. O artista respondeu:
- Tenha
calma! O tempo é nosso amigo e te afianço de que estamos todos bem e aqui!
Fez uma
pausa, sorriu matreiramente e continuou:
- Meus
caríssimos iguais, meus convidados. Sabem... Absolutamente nada na minha vida
aconteceu de uma maneira normal. E não havia um porquê para meu casamento ser.
Olhou para
Meredite:
- Amiga...
Minha noiva está muito calada, debaixo desse véu... - apontou para o cavalete.
- Você acha
que ela vai me aceitar como esposo amantíssimo, perdoar, saber lidar com todos
os meus defeitos, me iluminar em todos os momentos e além disso permitir que eu
a ame diante de todos os horizontes, sejam eles azuis ou cinzas, sendo para
toda eternidade a musa e dona desse coração?
A artesã
refletiu. Ela estava com as mãos suando:
- Léo, eu
não estou compreendendo.
- Você é
sensível! Apenas diga se eu sou compatível com alguém puro de espírito como ela
é.
- É claro
que sim! Você é um homem de grande honra! Você merece todo amor e muita
felicidade!
Meredite
disse essas palavras sentindo as forças de seus sentimentos por Leonardo a
sacudirem. Terminou a frase com os olhos marejados levemente. Ela não queria
deixar aquelas lágrimas de afeição rolarem, para que tal não soasse como despeito
diante do enlace do pintor. A verdade, ela sabia, mas não podia deixar crescer,
aquela ponta de tristeza por não ser ela a estar se casando com seu amado. Ela
tinha que permanecer forte e ser boa como sempre fôra. Precisava ser claridade
no caminho daquele casal. Então, se controlou.
- Já posso
erguer o véu! - assentiu o artista.
Leonardo
segurou as pontas do pano deixando que o tecido caísse graciosamente para trás
do cavalete, revelando a pintura.
Todos se
movimentaram para observar melhor, e as tintas que viram desfilar mostravam a
jovem artesã, sentada ali mesmo entre as flores daquele campo onde predominavam
as flores alaranjadas. Um lindo vestido rosa mostrava suas mangas delicadas,
esvoaçando junto com a fita branca presa em laço a seu grande e feminino chapéu
de palha. Ao fundo, variados pássaros buscavam seu destino sob o céu e outros
descansavam sob o Sol. Inúmeros verdes, azuis, amarelos, rosas... E o centro...
O centro daquele Universo... O Universo que o reensinara a viver era ela...
Meredite!
Todos
deveriam estar estupefatos, porém, passada a expectativa inicial, depois dos
primeiros murmúrios surpresos, os entreolhares dispensaram questionamentos e
revelações. Estava tudo ali. Tudo certo como água nascente.
Leonardo
tocou de leve a mão de Meredite e com a outra mão ergueu tranquilamente seu
rosto, segurando seu queixo com brandura. Seus olhos se encontraram e ela
deixou que suas lágrimas, agora plenas de alegria rolassem por sua face até
tocar os dedos dele.
- Você
reafirma? Me quer? Me deixa cuidar de você?
- Pra
sempre!
O artista
deixou que um dos expectadores retirasse o quadro do caramanchão para que a
cerimônia, com a artesã ali, pudesse transcorrer com mais espaço. Enquanto
isso, Leonardo, se dirigindo aos amigos mais próximos falou:
- Eu nunca
escondi que a minha amada é uma verdadeira obra de arte!
Em seguida,
conduziu sua noiva a fim de que se colocassem voltados ao altar. Uma menina de
aproximadamente meia década de existência se aproximou da mesa e ali depositou
um lindo buquê branco, azul e amarelo, um presente único da natureza, pois,
apenas a parte alva era vegetal, repolhudos dentes-de-leão, as cores solar e
turquesa que também o compunham, na verdade, eram borboletas que haviam se
unido ao místico ramalhete, bela e voluntariamente. O balançar causado naquelas
flores pela brisa e delicado movimentar de dúzias de pares de asas fazia
daquele momento uma poesia divina. A presença de uma música suave com acordes
doces de violino e acordeon beijava os ouvidos de todos, que, mesmo assim
puderam escutar nitidamente quando o homem mais vivido pronunciou:
- Querer
Bem é aceitar, apoiar, sorrir, chorar, ir e esperar. O amor nos foi ofertado
pelos deuses para reconhecermos nele algo como o suco de nossas uvas. Cada gota
é uma, é insubstituível, é um ser. Cada casal transborda então uma alquimia
perfeita e sem igual no Universo. Dito isso... Ambos sabendo que já fundiram a
essência de seus sentimentos maiores, aceitam eternizar essa magia, defendê-la
e expressá-la em seus olhos e atitudes, no silêncio ou diante de um mundo?
- Sim!!! – Leonardo
e Meredite responderam simultaneamente.
Então a
menina e o menino que ali estiveram durante toda a cerimônia também
participaram do ritual, ela pegou uma pétala do ramalhete que representava o
outono e também uma pétala que representava o verão e o menino retirou uma
pétala representante da primavera e outra que simbolizava o inverno e juntos
colocaram dentro do cálice enquanto falavam em uníssono:
- Que assim
seja durante todas as faces das terras!
O casal
mais maduro entrelaçou suas mãos e em seguida segurou em conjunto o recipiente
que continha suco de uva. Enquanto preenchiam a taça com o líquido falaram
juntos:
- Que exista
sempre mais sabor, cor, refresco e afeto em seus caminhos! Que sejam felizes! É
o que basta e reina!
O suco
parou de cair sobre as pétalas quando as palavras cessaram. A anciã ergueu o
cálice e em seguida ofereceu ao casal. Ambos sustentaram o receptáculo e
sorveram a bebida ao mesmo tempo enquanto a dupla mais experiente e a mais
jovem declaravam:
- Estão
unidos perante o Universo. Os deuses os aprovam e os amam. Benditas continuem
vossas vidas e que suas sementes vivam e cintilem!
Todos sorriram
naquele ambiente... Era claríssimo como todas as fontes de pureza estavam
plenas. Leonardo então abriu as duas pequenas caixas. Uma delas guardava a
pulseira confeccionada com o rubi. Era linda, Meredite havia superado todas as
expectativas... A gema flutuava em um trançado deslumbrante branco rosado. A
segunda caixa revelou também uma jóia encantadora. Um radiante fio vermelho
abraçava um arredondado quartzo rosa que parecia um coração. A artesã o
observou e o pintor vislumbrou a pergunta quieta que desfilava no semblante da
artista.
- Tamara
criou! A meu pedido e com toda dedicação ela lhe preparou esse mimo fundamental
para nossos votos. - ele sussurrou.
Meredite
lançou um olhar para sua amiga e sorrindo lhe transmitiu, com seu jeito único,
todo seu agradecimento e congratulações pela espetacular obra.
A música
aumentou levemente seu tom enquanto eles vestiam as pulseiras um no outro e
trocavam mais e secretos votos de amor. Passado esse momento, os recém-casados
deram seu primeiro beijo diante de seus convidados. Um misto de aplausos, vivas
e elogios se fez ouvir naquele nobre recanto.
Passados
mais alguns instantes, as moças que almejavam também se casar formaram uma
espécie de público diante de Meredite. Naquela região era costume se fazer tal
coisa, as mulheres casadouras cercavam uma recém-casada na espera de receber
presentes ou/e conselhos. A artesã distribuiu cristais para as damas e
recomendou que sempre fossem elas mesmas, diante de qualquer situação. E então,
depois, lançou um caloroso beijo em direção a todas e soprou docemente o buquê
que mais cedo tinha sido depositado perto dela, no altar. As borboletas voaram,
e, como ensaiadas, cada uma delas pousou no ombro de uma mulher. As moças,
felizes com o resultado daquele evento começaram a se dirigir aos espaços para
descanso e refeição. Todos tinham a liberdade para se servir das guloseimas
expostas.
A música
assumiu de vez o seu lugar naquela confraternização, o ambiente dançava naturalmente,
casais rodopiavam, cavalheiros sustentavam os movimentos de suas bailarinas. Um
rio de felicidade fluía e definia seus envolventes cursos. Leonardo e a artesã
encontraram seu primeiro bailar rumo à vida a dois, uma animada valsa. A seguir,
se lançaram à vigorosos acordes camponeses.
E com
certeza, os recém-casados, assim como todos ali presentes não conseguiram
evitar se encantar ao perceber que o rei tinha se postado hábil e
enamoradamente como companhia da moça que havia ornado sua fronte com flores.
Aquelas horas já previam o que os aldeões, e, quem sabe, até mesmo o monarca,
desconheciam... A futura rainha estava ali, era ela... Escolhida no coração da
sociedade, eleita por seu saber e humildade. E que ele seria um soberano ainda
mais autêntico por se casar por amor.
A noite
chegou, a iluminação foi primorosamente realizada... Além das tochas
engenhosamente colocadas, a lua e inúmeras estrelas ilustravam o lugar.
A artesã e
seu amado, depois de receberem os cumprimentos, conversarem com todos e os
fazer se sentir à vontade, se afastaram e ficaram olhando o perfil das
montanhas. Se abraçaram e beijaram demoradamente. Estavam juntos, eram o
futuro... Ele e sua Meredite, então oficialmente, di Leon.
Janeiro de 2021
Ana Luiza Lettiere Corrêa (Ana Lettiere)
Com Patrícia Lettiere ( http://pintandonopedaco.blogspot.com.br ), Paulo Renato Lettiere Corrêa ( http://osabordamente.blogspot.com.br ) e todos os meus
inspiradores.
Olá, vim conhecer o seu blog... muito lindo!
ResponderExcluirPassando para te desejar uma boa noite.
Venha conhecer o meu! O link é:
https://ofantasticomundodebete.blogspot.com/
Beijinhos !
Obs: estou seguindo você.
Oi, Bete! Estou muito feliz por você ter apreciado e estar seguindo meu blog! Vi seu comentário e fui correndo conhecer seu espaço artístico e já comecei a te seguir. Te desejo um final de semana iluminado e muita paz, sonhos e sucesso sempre! Beijos!
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